Fatshimetrie: Quando o cinema perturba e questiona a sociedade marroquina
O recente festival internacional de cinema de Marraquexe foi agitado pela exibição do filme “Cabo Negro”, provocando reações e reflexões na sociedade marroquina. Esta obra cinematográfica, dirigida por Abdellah Taia, conta a história de dois jovens que passam o verão numa praia do norte de Marrocos. Para Taia, um cineasta marroquino assumidamente homossexual, era essencial destacar a realidade dos gays marroquinos através do prisma do cinema.
Esta decisão artística não deixou de dividir a opinião pública, com alguns elogiando a coragem e o empenho do realizador, enquanto outros questionaram a legitimidade de lidar com a homossexualidade nas produções cinematográficas marroquinas. O cancelamento da sessão de perguntas e respostas planeada após a exibição do filme ilustrou as tensões presentes na indústria cinematográfica marroquina.
O festival de Marraquexe, montra do cinema mundial, pretende ser um espaço de liberdade e tolerância artística. No entanto, o confronto entre os valores progressistas defendidos por este evento cultural e as realidades da censura e das restrições económicas enfrentadas pelos cineastas marroquinos destaca os desafios que o sector do cinema enfrenta em Marrocos.
Embora os filmes estrangeiros com cenas de sexo possam ser transmitidos sem obstáculos durante o festival de Marraquexe, o cinema marroquino tem de lidar com restrições e pressões políticas. A homossexualidade continua a ser um tema tabu no código penal marroquino, colocando limites à liberdade de expressão dos artistas locais.
A polémica sobre “Cabo Negro” levanta questões fundamentais sobre a identidade e missão do festival de Marraquexe. É um evento de prestígio que pretende atrair a atenção internacional ou uma autêntica plataforma para apoiar e destacar o cinema marroquino em toda a sua diversidade e complexidade?
Face a estas questões, parece essencial reflectir sobre o lugar do cinema marroquino no panorama cultural nacional e internacional. Como conciliar a liberdade artística com os constrangimentos legais e políticos? Como podemos proporcionar um espaço de expressão aos cineastas locais, preservando ao mesmo tempo a identidade e os valores culturais de Marrocos?
A exibição de “Cabo Negro” e os debates que se seguiram evidenciam a necessidade de repensar as políticas culturais e artísticas em Marrocos. É hora de reunir as diferentes sensibilidades e visões de mundo presentes na sociedade marroquina, a fim de construir um cinema plural e comprometido, representativo da diversidade deste país fascinante.