Como o necrotério de Inongo ilustra o conflito entre as tradições locais e a modernização dos cuidados funerários?

**Inongo Morgue: A Revolta das Tradições em Face da Inovação em Saúde**

Em Inongo, província de Mai-Ndombe, um paradoxo pungente ilustra os desafios de saúde de uma região que enfrenta uma colisão entre a herança cultural e as necessidades modernas. O necrotério, apresentado como um grande avanço pelas autoridades locais, agora é uma memória esquecida, um prédio abandonado que revela problemas muito mais profundos do que a simples falta de infraestrutura. Isso levanta uma questão crucial: como podemos conciliar práticas tradicionais com as demandas contemporâneas de saúde pública?

### Uma infraestrutura de sonho, uma realidade desbotada

Dando uma nova dimensão à gestão de óbitos, o necrotério do hospital geral de Inongo, cuja inauguração era um acontecimento antecipado, encontra-se agora em estado de ruína. Valorizada por alguns elementos de orgulho administrativo local, ela se transformou em uma testemunha silenciosa das falhas estruturais de um sistema de saúde deficiente. De fato, após apenas dois meses de atividade, o estabelecimento foi obrigado a fechar as portas devido ao consumo de combustível necessário para seu gerador. Essa escolha operacional, que revela um planejamento deficiente, evidencia uma gestão negligente que levou à estagnação dessa infraestrutura crucial.

Em 2021, esse projeto era promissor: representava a esperança de melhorar as práticas funerárias na região. Apesar da natureza voluntária do serviço, que visava incentivar os moradores a adotar essa solução inovadora, o fracasso foi inevitável. O necrotério recebeu apenas cerca de dez corpos antes que o compromisso com seu uso a longo prazo morresse, levando consigo a esperança de modernizar as práticas funerárias.

### Um choque cultural: tradições no coração da resistência

A resistência à mudança, exacerbada por profundas crenças culturais, contribuiu para o abandono do necrotério. O testemunho de Seba Manongo, presidente do conselho municipal de Bonse, destaca esta realidade: “Em caso de morte, a família recupera o corpo…” Este fenómeno não é exclusivo de Inongo, mas constitui um caso típico de “uma realidade mais ampla”. problema em todo o continente africano, onde a abordagem tradicional à morte está muitas vezes fora de sintonia com a infraestrutura moderna.

Na África, o tratamento corporal é geralmente baseado em rituais culturalmente arraigados, resultando em uma infinidade de práticas que honram a memória do falecido. Dessa perspectiva, os necrotérios são frequentemente vistos como intrusivos. Estatísticas de 2022 revelam que quase 60% das famílias preferem manter os corpos em casa, vendo isso como uma expressão de respeito e vínculo familiar. Diante dessa dinâmica, é fundamental que as autoridades sanitárias não se limitem a importar estruturas sem um profundo conhecimento das especificidades locais..

### Rumo à reconciliação: a adoção de soluções fotovoltaicas?

A iniciativa prevista pelo governador Nkoso Kevani, baseada na integração de painéis fotovoltaicos para alimentar o necrotério, pode muito bem oferecer uma saída, à primeira vista. De fato, a eletrificação renovável representa uma resposta à inadequação dos serviços locais, muitas vezes confrontados com avarias e custos operacionais proibitivos. De forma mais ampla, uma abordagem ecologicamente correta poderia facilitar a aceitação do necrotério pela população local, garantindo ao mesmo tempo o uso deste espaço crucial.

Por fim, a conscientização continua sendo essencial. Em vez de impor uma infraestrutura, é por meio da comunicação profunda e do envolvimento das comunidades que a real propriedade desses serviços pode emergir. Oficinas, reuniões comunitárias e campanhas sobre a importância de um necrotério funcional devem ser consideradas para estabelecer uma verdadeira reflexão coletiva sobre o tratamento dos corpos.

### Conclusão: Uma lição a aprender

O caso do necrotério de Inongo ilustra brilhantemente os desafios enfrentados por muitos sistemas de saúde africanos em suas tentativas de modernização. O sucesso de tal empreendimento não se limita à simples construção de infraestrutura, mas exige uma reformulação da compreensão dos comportamentos socioculturais. Longe de serem inevitáveis, os obstáculos encontrados pelo necrotério de Inongo podem, se tratados com cuidado e respeito, tornar-se alavancas para a mudança, permitindo que a comunidade se aproprie de uma inovação essencial, ao mesmo tempo em que honra suas tradições.

À medida que o desenvolvimento da saúde em regiões como Mai-Ndombe enfrenta frustrações, o importante agora será trabalhar dentro de uma estrutura de diálogo e escuta, para que os serviços de saúde não sejam percebidos como imposições, mas como extensões naturais e necessárias das práticas culturais existentes.

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